quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Alquimia do Verbo

DELÍRIOS

II ALQUIMIA DO VERBO

Para mim.
A história das minhas loucuras.
Há muito me gabava de possuir todas as paisagens possíveis, e julgava irrisórias as celebridades da pintura e da poesia mo- derna.
Gostava das pinturas idiotas, em portas, decorações, telas circenses, placas, iluminuras populares; a literatura fora de moda, o latim da igreja, livros eróticos sem ortografia, romances de nossos antepassa- dos, contos de fadas, pequenos livros in- fantis, velhas óperas, estribilhos ingênuos, rítmos ingênuos.
Sonhava com as cruzadas, viagens de descobertas de que não existem relatos, repúblicas sem histórias, guerras de religião esmagadas, revoluções de costumes, des- locamentos de raças e continentes: acreditava em todas as magias.
Inventava a cor das vogais! A negro E branco, I vermelho, O azul, U verde. Regulava a forma e o movimento de cada consoante, e , com ritmos institivos, me vangloriava de ter inventado um verbo poético acessível, um dia ou outro, a todos os sentidos. Era comigo traduzí-los. Foi primeiro um experimento. Escrevia silêncios, noites, anotava o inexprimível. Fixava vertigens.

(Rimbaud)
Tradução de Paulo Hecker Filho

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